quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Nasceu, revelou-se!


Nasceu de sete meses! Depois de sete meses de processo, estreamos e revelamos o Retrato do Artista Quando Coisa.
A estréia foi na Casa das Artes de Ponta Negra (Rua São Mateus, nº 430, Vila de Ponta Negra), no dia 1 de dezembro, em duas sessões: a primeira no entardecer, às 17 horas e a segunda na noite, às 20 horas.
 
Foi uma estréia linda! Contamos com um público maravilhoso, que nos acrescentaram de garças, que aceitaram nosso convite de olhar de azul, que brincaram de transver conosco. A Bololô Cia. Cênica gostaria de agradecer imensamente à Casa das Artes de Ponta Negra pela acolhida, aos Grupo de Teatro Clowns de Shakespeare pelo apoio e a todos que nos assistiram e nos enriqueceram com seu olhar.

E o melhor de tudo é que ainda não terminou! Próximo sábado, dia 8 de dezembro, tem mais duas sessões, nos mesmos horários.

Quem ainda não viu, corre pra ver! :)

Até lá!

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Teaser!

Tá chegaaaando!

Faltam 8 dias para a estréia. Pra ter um gostinho do que será o espetáculo é só conferir o teaser feito pela nossa diretora de arte Paula Vanina.

http://vimeo.com/54065261#

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Silêncio de pedra e gritinhos de empolgação

Queridos e queridas,

primeiro queremos nos desculpar pelo nosso silêncio de pedra aqui no blog. Mas foi pela boa causa da loucura: loucura de ensaios, de falta de tempo e de muita empolgação com a estréia que está cada vez mais próxima! Com grande alegria, informamos que dia 1 de dezembro estreamos! Logo logo o blog estará entulhado com todas as informações a respeito.
Esses tempos de silêncio foram tempos de muito trabalho. Tivemos novas vindas dos nossos três diretores da Cia. Luna Lunera: primeiro Odilon Esteves, depois Cláudio Dias e por fim José Walter Albinati.
Foram períodos muito intensos, pois como eles não podem passar muito tempo aqui, nós temos que aproveitá-los ao máximo, no tempo que temos.
O que tínhamos até a vinda do Odilon? Um primeiro rascunho de roteiro para o espetáculo, um roteiro assim sem muito pé e muito menos cabeça, um roteiro cheio de imagens, mas poucas conexões, pouco fluido dramaturgicamente falando. Odilon nos presenteou com o simples e o óbvio. Nos deu uma nova perspectiva. Nós estávamos em um terreno muito abstrato, cheio de figuras abstratas com as quais já estávamos bastante familiarizados, e então ele fez a simples proposição de tentarmos figuras realistas, cotidianas.
O resultado foi impressionante. Por incrível que pareça, nós já havíamos tentado tudo, improvisado um milhão de coisas, mas nunca tínhamos tentado figuras realistas. Estas figuras nos trouxeram para outro nível, um nível de humanidade, de empatia. Alguma eram figuras de dentro da poesia de Manoel de Barros, outras eram figuras de fora, mas que encontraram seus reflexos na poesia manoelesca.
Assim, abraçamos estas figuras - agora elas são partes essenciais do espetáculo.
Outra contribuição imensurável do Odilon foi que ele nos mostrou que a nossa morada era nosso lugar de estréia. Estávamos com sérios problemas de produção pois não encontrávamos lugar para estrear. Odilon simplesmente olhou ao redor, olhou de azul, e nos fez ver que nossa morada, a Casa das Artes de Ponta Negra, onde ensaiamos todos os dias, é o lugar mais lindo e mais manoelesco que podíamos querer para a estréia. Assim o será!
Então veio o Cláudio e com ele começamos a escrever um novo roteiro, já acrescentado com as figuras realistas exploradas com o Odilon.
A última vinda foi a do Zé Walter, que nos ajudou a desenvolver o roteiro. Com o Zé aqui, fizemos também nosso segundo ensaio aberto, já na nossa morada. O ensaio aberto foi riquíssimo. É impressionante como as leituras do público são leituras ricas, cheias de preciosidades e que amiúde nos surpreendem, nos dão de volta coisas que nem imaginávamos.
Agora, com o roteiro finalmente finalizado, estamos dados aos ensaios e às finalizações da produção.
Em breve contamos mais. Em breve vocês poderão ver mais.



quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Luaretices, silbatilintes, arlimenções e paulatinamentadas

Olá, queridos parceiros de bordo.
A semana começou com alguns problemas de logística que tivemos que ir resolvendo com toda a calma. A cidade toda parece estar em crise e o nosso processo sempre ajuda a aliviar o coração, de alguma forma. Hoje acordamos com um presente de Tiago Landeira, nosso preparador vocal, e resolvemos dividí-lo com vocês.
Abraços bololoridos!  






"Como deitar num lugar de paina
Respirando o vento
E ver acontecer ao toque, a ilusão
Entre impressões vocais trazidas da insensatez
E de outro lugar da lembrança
Luaretices, silbatilintes, arlimenções
E, paulatinamentadas, as coisas formam o meu lugar de presente e de perto
Ah! Já não estou mais de fora da ilusão do meu afeto
Me apego aos braços e cru e dormente me sinto tão feliz."

(Landeira)







segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Experimentando deformantes para a voz


Semana começando, segunda-feira preguiçosa e de chuva em Natal. Nada melhor então do que relembrar o fim de semana. Hoje o assunto é a sexta-feira! Sexta-feira é nosso dia de preparar a voz e achar deformantes para ela. Para isso, contamos com nosso querido preparador vocal Tiago Landeira. Toda sexta é descoberta, e são sempre descobertas incríveis, de gostosas e surpreendentes, cheia de estímulos que à primeira vista soam abstratos, mas se corporalizam maravilhosamente na voz de quatro atores em busca.

Tiago na sexta passada nos passou uma série básica de exercícios vocais para repetirmos todos os dias, mesmo sem sua presença. Consiste em: exercícios de respiração, soltar o ar em S e Z, fazer ma me mi mo mu.... Essas coisas. Mas o mais incrível é o jeito como o Tiago nos ajuda a tirar nossas vozes sabe lá deus de onde. A minha e a de Paulinha, por exemplo, estavam muito “para trás”, tímidas, na garganta. Quando conseguimos colocá-las para frente, novas vozes ressoaram no espaço, com outro volume, outro peso, outro brilho.

Tiago, além da técnica, também experimenta conosco estímulos poéticos. Houve um trabalho, por exemplo, em que ele pediu para fazermos pequenas partituras vocais e corporais, que tinham como ponto de partida versos do Manoel de Barros. Cada um recebeu um verso. Silbat ficou com "uma rã me pedra".  Arlindo com ""um passarinho me árvore". Já o meu verso era “os jardins se borboletam.” A mim, Tiago pediu que o jardim fosse meu corpo e as borboletas a minha voz. Pediu ainda que houvesse um espinho no meu jardim. Lindo, né? O resultado foi uma voz que ele nunca tinha ouvido, e que eu nunca tinha experimentado tão conscientemente.

Já estou ansiosa pela próxima sexta, pra ver quais outros deformantes para a voz iremos explorar. 

Lua

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Como ondas de entulhos


Olá, caros leitores do processo do Retrato!

A semana passou como uma brincadeira boa, que acaba na melhor parte. Mas a postagem de hoje se destinará a comentar um pouco do que foi trabalhado na noite de ontem, quando passamos por mais uma condução do Silbat. O momento é de fazer muitos treinamentos físicos que nos ajudem a ter mais precisão e um perfeito reconhecimento de nosso cenário e figurinos = os objetos de descarte, e por isso, temos contado com a experiência que Rodrigo traz da dança pra nos ajudar nessa etapa.
O trabalho começou com um bolinho de nós quatro (Arlindo, Luana, Silbat e eu) no centro do espaço. Respirando juntos, de olhos fechados, tentando nos investigar internamente. São raros os momentos em que nos dispomos a escutar um pouquinho que seja o que o coração, o estômago, o sangue circulando, a pele, enfim, o corpo inteiro quer nos dizer. Pra um artista, essa é uma parte muito importante do trabalho.
Fomos convidados a espalhar, aleatoriamente e em silêncio, todos os nossos objetos pelo espaço. Sempre tendo o cuidado em perceber textura, peso, cor, de cada coisinha. Passamos então pra um exercício que tinha, basicamente, três focos: alongar o corpo, manter os apoios (pés, mãos, cotovelos, joelhos...) sempre em contato com um objeto e obedecer a um mesmo ritmo - tornando o deslocamento bastante fluido. Essa etapa foi se dinamizando de acordo com os estímulos que Silbat propunha.
    Trabalhamos a noite inteira em relação com os objetos. Fizemos séries de rolamentos variados, como quando tínhamos de sair de uma diagonal para a outra da sala, tentando carregar no corpo o maior número de coisas. Pra quem vê de fora é uma imagem muito bonita. Como ondas de entulhos passando por aquele chão cor de areia. Entulhos poéticos, principalmente pra nós, que já estamos tão familiarizados e temos afeto por cada pedacinho de tecido, caixa, miudeza.
Treinamos alguns saltos entre os espaços vazios também. Tudo isso pra adquirir, como falei anteriormente, precisão e familiaridade. No que se pisa, no que se pega, no que se joga, no que se coloca no corpo e transforma em parte de si. Finalizamos o trabalho tentando recuperar algumas figuras já criadas anteriormente e outras inéditas, no menor tempo possível. Um exercício crucial pra cena que pretendemos levar aos palcos daqui há dois meses, aproximadamente.  
 Como essa semana foi embora rapidinho, as outras também irão. Daqui a pouco tem espetáculo prontinho pra ser compartilhado. Chega a dar frio na barriga... mas que alegria será! 

Paulinha.

P.S.: Abaixo, uma foto da nossa nova sala de trabalho. Percebem o chão cor de areia?! Pois bem, é nele que o nosso suor tem se derramado nas últimas semanas. =)


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O Corpo Está aos Pingos....


 Por Alindo Bezerra:

Ontem realizamos o trabalho de treinamento técnico conduzido de forma primorosa por Silbat. Iniciamos com um alongamento que foi se redimensionando para um fluxo de movimento contínuo do corpo, e na sequência fomos agregando outras indicações de deslocamentos pelo espaço, ampliação do movimento no corpo, jogo do espelho, saltos, quadrantes considerando a técnica “viewpoints” utilizada nesse processo. Pensar e considerar a arquitetura do espaço, nos faz ganhar uma percepção espacial muito importante para este trabalho. O treinamento nos coloca em um estado de jogo e em uma relação viva, pulsante. O corpo ganha uma outra dinâmica, uma prontidão para o que está por vir. E esse foi apenas o início de um treinamento intenso e vibrante que ainda trilharemos, sem pressa, apenas se entregando um pouquinho mais a cada dia. Amanheci com o corpo todo dolorido, mas mesmo assim, entendo que a dor é necessária.
Como disse Paulinha ao final do trabalho, já na avaliação:
"Minha mão ainda treme e o corpo está aos pingos. Escrever é complicado nesse momento. Exige uma concentração e controle de musculaturas pequenas que estão pulando feito pipoca na panela. O caderno está ficando sujo do óleo da pipoqueira...
Porém, as pipocas ainda teriam condições de pular mais e mais, sem queimar e sem estragar o gosto."

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Antes tarde do que nunca...

Comecei o alongamento dos atores estimulado pelos pássaros e pelo "voar fora das asas", que o manoelzinho fala. Asas, tronco, rabo, pisada e por últmo a cabeça. Depois de todos os pássaros formados e ampliados, exauridos de tanto bater asas, pedi para que fossem diminuindo, até aquilo tudo se transformar num gesto. Todos caminharam em direção a camera fazendo esse gesto descoberto no encerrar dos vôos. Alex, que estava na camera, lembrou da imagem dos corpos com contrações abdominais da condução do Odilon, sentiu a mesma sensação. Incrível que todos os movimentos resultaram em gestos tristes, inibidos, e com pouca vida. E logo o pássaro que é símbolo da liberdade. ONDE ESTÁ SUA LIBERDADE? Perguntei aos atores, no fim. Elegi as cores azul, roxo e cinza para o trabalho. Todos foram se "vestir dessas cores" para iniciar o procedimento principal. Vestir é uma palavra já deslimitada entre nós do Bololô. O vestir passou a ser uma espécie de composição de outra figura, outro ser, um corpo-coisa. "Entulho serve para poema", diria manuelzinho, turbante de calça, sapato de saco, mãos de bolas de encher..., foram coisas vistas.  

Esse é um relato da nossa atividade no dia 20 de Agosto, dias antes da chegada do Zé Walter. Tivemos uma reunião para levantarmos os acontecimentos importantes nos laboratórios, para a chegada do nosso lunático da dramaturgia. Portando esse material, elegi uma cena interessante dentro do processo de cada um dos atores, quatro cenas. Relacionei cada cena a um dos poemas do "Retrato do artista quando coisa", quatro poemas. Utilizei o inventário de ações físicas e o de animais, construídos no período em que o Luna Odilon esteve conosco, e coletei tudo referente a cada poema selecionado para servir de estímulo para criação de movimentos:

 - Esse movimento precisa ter sentido pra você, se isso vai comunicar algo pra alguém é uma preocupação secundária. Os canais de entendimento são outros. Não esqueçam nenhuma parte do seu corpo, da unha do pé a pontinha da voz.

Esse foi o dia da cena de Arlindo, GERMINAÇÃO DE INÉRCIA. O poema referente foi o nono do Retrato, esse aqui.

"Havia no Lugar um escorrer azul de água
sobre as pedras do córrego
(Um escorrimento lírico.)
Andava por lá um homem que fora desde
criança comprometido para lata.
Andava entre rãs e borboletas.
Me impressionou a preferência das andorinhas
por ele.
Era um sujeito esmolambado à feição de ser
apenas uma coisa 
Era um sujeito esmolambado à feição de ser
apenas um trapo.
Percebi que o homem sofria por dentro de uma
enorme germinação de inércia.
Uma inércia que até contaminava o seu andar
e os seus trajos."

- MANOEL DE BARROS


Ações físicas utilizadas: Escorrer, Andar, impressionar-se, perceber, sofrer

Depois de criados um movimento para cada palavra, pedi que cada um juntasse os seus movimentos na ordem e na quantidade de vezes que quisesse, fazendo uma pequena "coreografia", cena.

Estímulos individuais: Paulinha - Criança e germinação de inércia
Luana - Borboletas e Andorinhas, com a indicação que ela teria que usar som na partitura 
Arlindo - Germinação de inércia e contaminar

Cada um adicionou seus dois estímulos a sua coreografia em forma de mais dois movimentos.

Fim do procedimento principal.

Durante a apresentação dos resultados utilizei o nosso IMAGINÁRIO, para preencher os movimentos com referências visuais. SUPER FUNCIONOU. Imaginário é o nosso dicionário de imagens para expressões, frases e palavras Manoelescas, fizemos ele no período que o Odilon "Esteves" aqui.

Experimentamos várias qualidades de movimento, suave, pesado, lento, rápido, entre outros, criamos outras experiências para essas coreografias. Fim do dia de trabalho, foi um dia suave.

Beijos do Silbat :)

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Dentro do Quintal, Tudo é Possível...



 Por Arlindo Bezerra...

É difícil relatar na escrita, o que aconteceu de forma tão viva no período de trabalho com o Zé Walter, o terceiro Luna Lunera a nos visitar e compartilhar experiências conosco. Já esperava que este seria o momento de iniciarmos escolhas, já havíamos sido provocados pelo Odilon e Cláudio, o primeiro na relação com a palavra enquanto ação vocal, e o segundo com a técnica do Contato e Improvisação e o viewpoints, ambos em diálogo com a obra do Manoel de Barros. A função que estava reservada para o Zé Walter neste momento do processo, era de ser um olhar organizador para o que já havia sido criado, respeitando a criação individual e coletiva da Bololô. O Zé executou com muita inteligência esse trabalho. Confesso, que estava muito tenso no nosso primeiro encontro, tinha medo de desapontar as expectativas que poderiam existir, mas o olhar carinhoso que fomos criando entre todos, foi gradativamente me deixando confiante para se entregar e desnudar-se. Já sentia que não precisaria existir uma preocupação de desapontar ou não, a cumplicidade já estava estabelecida na atmosfera do nosso trabalho. 
            Em um primeiro momento, depois de havermos conversado sobre o trabalho, e tentado explicar o percurso do processo, o Zé nos pediu para revelar na cena os caminhos que havíamos percorrido. Fomos lembrando de alguns procedimentos que tínhamos experimentado e entramos em laboratório com um espaço muito aberto para o que poderia acontecer. E aconteceu... Revelamos algo. Uma das primeiras coisas que o Zé considerou foi sobre a música dentro do trabalho, fazendo-nos perceber o quanto a criação em laboratório estava sendo guiada pela música. E nos colocou em um estado de silêncio, explorando as outras sonoridades que podemos provocar. Individualmente foram feitas várias observações com muita sensibilidade e cuidado. Cada um escutou coisas muito preciosas e que pertencem a cada. Escutar e refletir, pra mim era suficiente...
            A generosidade do olhar que vi pulsar nos olhos do Zé trazia também o pensamento de um grupo e a compreensão sobre o fazer cênico de um coletivo. Todos os retornos que o Zé nos deu me fez acreditar ainda mais na força do nosso trabalho. Longe da vaidade do ser bom ou ruim, mas na possibilidade de uma coerência que podemos construir enquanto grupo, apropriando-se de um método de criação que nos pertença. O trabalho do Retrato está para além de um espetáculo, faz parte de um processo de formação de um grupo. Fico muito feliz e emocionado com a oportunidade de termos como mestres os queridos do Luna Lunera (BH), um grupo que cativamos uma profunda admiração.
            O trabalho com o Zé Walter nos fez pensar qual o lugar deste espetáculo, iniciando uma criação de livres associações e conceitos com a obra do Retrato do Artista Quando Coisa. A dramaturgia começou a ser desenhada. Questões do tipo. O que essa obra fala? Qual o espaço deste lugar em que essas quatro-coisas-corpo estão imersos? Como provocar imagens e sugestões? Como dessacralizar o texto poético? Lembro que no ensaio aberto o Zé nos instigou a pensar o que é o universo do Manoel. Surgiram várias definições: Poeta de quintal, Meninos brincam no terreno baldio, e ainda, “dentro do quintal tudo é possível”. Estamos no terreno da desutilidade, acredito.
            Sobre o ensaio aberto, foi uma experiência reveladora. Abrimos o processo para o olhar de um público virgem. Me senti muito desafiado e provocado em fazer o trabalho, fiquei muito orgulhoso da entrega que o coletivo teve, a energia que irradiamos um para o outro foi incrível. Acreditamos no trabalho que mostramos. E entendo que o ensaio não nos traz um resultado congelado da criação, não podemos nos colocar em uma zona de conforto acreditando que o trabalho está pronto, e acho que nunca estará. Sei que há um longo percurso ainda a ser caminhado.
            A sintonia de trabalho de criação da equipe e a entrega ao processo, tem sido muito significativo também, conseguimos criar diálogos muito provocadores e intensos. É visível o nível de entrega de todos. O roteiro sugerido ao final do trabalho com o Zé Walter, fez sentir-me muito contemplado, tanto pelas relações entre as cenas mostradas, quanto pela abertura de criação que o roteiro possibilita. Senti-me satisfeito com as escolhas e possibilidade de aberturas que o roteiro permite. O desejo de fazer acontecer esse trabalho está muito forte em mim. E finalizo reafirmando a dificuldade que tenho sentido em resumir na escrita o que tenho vivido pulsante no corpo. A dramaturgia do nosso Retrato vem aos poucos ganhando vida, e essa organização dramatúrgica começou a partir do Zé, estou muito feliz com o que vem sendo produzido, e por ter conquistado um amigo/parceiro que me cativou no teatro e na vida.

     "Meninos brincam no quintal". É assim que me sinto, brincando no quintal da minha casa...

sexta-feira, 31 de agosto de 2012


O post de hoje fala sobre a semana de condução de Arlindo Bezerra, e o texto foi escrito com capricho por ele:

O homem em sua natureza primitiva pode revelar as coisas a partir de uma ótica desumanizada.
Iniciei o procedimento de condução muito inseguramente e com o desejo de estar dentro. Não optei por ficar olhando de fora. Fazia questão de participar ativamente o proposto no coletivo. Trouxe a proposta de representar através de uma seleção de expressões manoelescas, todas os enunciados que seja prenhe de uma identificação pessoal para com a obra do Retrato do Artista Quando Coisa, ou que possa ainda partir de outros livros do poeta. Pensando nessa perspectiva, começamos com essa “seleção natural” das terminologias poéticas, e catalogamos tudo em um papel.
Abaixo disponibilizo alguns exemplos de cada seleção individual:
Arlindo – os silêncios me praticam, entorpecer o cheiro do sol, rã me pedra, envesgar seu idioma, achar solidão, ser arrancado de dentro, olhar para baixo, entrar em estado de árvore, predicados de uma lata, memórias fósseis, des-heróis, incompletude, sossego de uma pedra, milagre estético, não use o traço acostumado, limpeza de um verso...
Luana – liberdade, coisas celestiais e coisas ínfimas, morrer é uma coisa indestrutível, sair entorpecido de haver-se, que hei de fazer? Artista!!! Substantivo escuro escorrendo, dores, limites, derrotas, experimento o gozo, coroa de flores,a noite, paz calmaria contentamento...
Paulinha –retrato, cristianizar, bulir, lixo, senso, adoecer, esgarçar, retrato do artista, trocar as árvores, ser coisa, germinar, brotar, desfrutar, bicho, pensamentos, perfumes, entontecer, esvaziar-se, ventania, vendaval, invenção, desejo, vento bom na janela, corpo solitário no brilho da lua, desobjeto artístico, brincar no quintal, carrapicho, rios riosriosrios, sem vergonhas, ferrolho quebrado feito para não servir...
Rodrigo Silbat – coisa, trocar as árvores, desempenho, dom de latas, velha, olho, predomínio por lírios, desejam a minha boca, cristianizar as águas, cheiro do sol, limites, deslimites, largado no chão, corromper, me pedra, manhãs, os jardins se borboletam, cio vegetal, envesgar, ter chuva, entorpecer...
Após essa etapa, passamos para um momento de criação de painéis individuais a partir do material que cada um havia levantado. Funcionava assim: Luana transcrevia para um papel na parede a seleção das expressões selecionadas por Silbat, e assim por diante. Cada um desenhava a representação do material que o outro havia elencado.
Segue abaixo o painel que contemplava os termos do outro naquele momento do exercício:
Painel das expressões de Arlindo feito por Paulinha:


Painel das expressões de Paulinha feito por Silbat:


Painel das expressões de Silbat feito por Luana:


Painel das expressões de Luana feito por Arlindo:


Na etapa final do trabalho passamos para um exercício de despir-se diante do painel que representava cada um. A proposta do trabalho, era expor o homem frente às questões que o tocam individualmente, e em seguida realizamos uma improvisação nesse ato de desnudamento. Considerando Manoel de Barros, encerramos o trabalho nús de nossas derrotas, limites e fraquezas.
Tais terminologias escolhida “ao acaso” por cada um, pôde revelar particularidades muito específicas de cada indivíduo dentro do processo.
E ainda podemos perceber como cada um possui uma qualidade de representação do outro, a partir dos estímulos que são oferecidos. É muito curioso ver a leitura que o outro tem de sí.
O olho vê, a lembrança revê, a imaginação transvê. (Manoel de Barros).
Na sequência do meu trabalho, no segundo dia condução, começamos passando por um momento de representação no corpo inspirados na construção dos painéis individuais do dia anterior. A proposta era que todas as representações individuais pudessem se contaminar pelo outro. E então, começamos a colorir o corpo, usar os traços, e estabelecer uma relação com o outro a partir dessa criação. Fazer surgir um corpo-coisa-sujeito-homem-desumano. O trabalho foi conduzido ao som da trilha sonora do disco “Recanto” da Gal Costa e alguns álbuns do Yann Tiersen. A partir dessas relações pudemos construir narrativas-dramatúrgicas- corporais de relevante significação. Paulinha se relacionou com Silbat e eu com Luana. Esse gráfico de relação pôde ser percebido mais conscientemente no trabalho na chegada do Zé Walter que considerou apontamentos que irei expor em outro momento. Encerrei o trabalho insatisfeito, saí com a sensação de que não consegui chegar aonde desejava.  Mas acreditava que amanhã seria outro dia. E foi...
Este seria meu último dia de condução individual do processo. Começamos em um ritual de encontro que fomos descobrindo lentamente, e até hoje tem nos revelado muito. Logo no início, expus a proposta do trabalho para aquele dia. O que haveria de diferente do dia anterior, seria apenas o direcionamento para algumas figuras (corpo-coisa-ser-objeto-desobjeto), e a liberdade improvisacional que essas imagens pudessem redimensionar. Então, pensando nisso, iniciamos do rito de encontro dos corpos, e fomos experimentando o contato e improvisação de nós quatro nus, totalmente despidos no centro do espaço de trabalho. Esse estímulo inicial foi nos levando para uma experiência laboratorial muito profunda, surgiram imagens poéticas lindas... Dentro do próprio exercício, consegui sair do laboratório e retornar por vários momentos. A força Dionísiaca estava muito latente neste dia. O trabalho teve vários momentos de êxtase coletiva – O estupro colorido (quando Silbat jogou Luana na parede e gerou uma imagem linda da agressão), a pintura coletiva dos painéis (quando nós quatro transfiguramos termos poéticos da obra Manoelesca) e por fim, o mergulho no monte de barro (quando Paulinha, Silbat e eu, nos jogamos no barro e experimentamos a queda e a textura da matéria do barro no corpo). Este último momento trouxe a natureza primitiva muito forte para experiência daquele dia. Foi revelador... Corpos nus que materializam ancestralidades!
            Faço relação dessa experiência com o vídeo “Sangue Latino” do Eduardo Galeano que o Odilon deixou de presente naquele primeiro momento.
“Não existem dois fogos iguais, cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Existem fogos grandes e fogos pequenos, e fogos de todas as cores. Existe gente de fogo sereno que nem fica sabendo do vento e existe gente de fogo louco, que enche o ar de faíscas. Alguns fogos são bobos, não iluminam nem queimam. Mas outros... outros ardem a vida com tanta vontade, que não se pode olhá-los sem pestanejar, e quem se aproxima se incendeia”
Eduardo Galeno.


por Arlindo Bezerra.